Friday, February 10, 2006

Aeronave

Observação: Esse conto já foi publicado no dia 9 de dezembro. Como muitas pessoas não gostaram do final e o consideraram confuso, estou publicando uma nova edição do conto, com um novo final.

Aeronave

Aconteceu em uma pequena cidade chamada Argina. Betinho, Eduarda, Marilinha, Lipe e Denis, todos com nove anos, brincavam na rua próxima a praça principal quando ouviram um barulho ensurdecedor vindo do céu. Lipe olhou para cima e não conseguiu dizer nada. Betinho gritou:

- Corre! Vai cair em cima da gente!

O objeto caiu a poucos metros deles. Com o violento impacto sobre o solo, as cinco crianças caíram de bruços. Na praça, os adultos deitaram no chão e cobriram suas cabeças com os braços.

Betinho virou o rosto para trás e viu a peça envolvida pela fumaça produzida pelo contato com o asfalto. Seus amigos levantaram junto com ele e os cinco foram em direção ao objeto. Parecia ser o bico de um avião.

- Tem alguém aí? Ei? Tem alguém aí? – chamou Eduarda.

- Ai, eu não quero ver gente morta! – chorou Marilinha.

- Relaxa, Marilinha! Vem Duda, vamos dar uma olhada lá dentro – falou Denis, puxando a amiga pelo braço.

Não havia sobrado nenhum caco de vidro nas janelas da frente. O que seria a porta de entrada de passageiros estava amassada como se tivesse levado um forte soco no centro. O suposto pedaço de um avião acabava ali, logo depois da porta. Betinho e Lipe entraram por trás, mas não viram corpo nenhum lá dentro.

- Crianças, saiam já daí! Os bombeiros já foram chamados! – gritou um senhor na praça.

- Ajudem! Ajudem! Uma outra parte caiu ali na rua de trás! – veio gritando uma mulher.

Eduarda e Denis saíram correndo em direção a tal rua. Mas a confusão ao redor era tanta, que os dois não conseguiam passar pelo asfalto. Havia um mar de curiosos e bombeiros chegando. Optaram por pular os muros das casas vizinhas e cortar caminho por dentro de cada quintal.

Afastados do objeto pelos bombeiros, Betinho e Lipe puxaram Marilinha pelos braços e seguiram atrás de Eduarda e Denis. Quando os cinco chegaram na outra rua, viram o que parecia ser o final da cauda de um avião. Também não havia ninguém lá dentro.

- Mas onde será que está o resto? – perguntou Betinho.

As crianças ficaram paradas olhando a peça, cheias de dúvidas. Na rua próxima a praça, os bombeiros cancelaram as buscas e confirmaram que não havia risco de explosão. Todas as pessoas em volta quiseram, então, olhar de perto o que agitou tanto o dia daquela pacata cidade. Mas ninguém quis tirar os objetos de onde eles caíram.

Na manhã do dia seguinte, as crianças encontraram um guia turístico rodeado de estrangeiros, próximo ao bico de aeronave.

- Estudiosos garantem que essa peça é um pedaço de uma nave espacial. Especula-se que um acidente ocorreu quando a nave entrou na órbita terrestre e dois pedaços caíram aqui, em Argina. – narrava o guia.

Cerca de um mês depois, outro guia dizia ter mais informações:

- O acidente separou a nave espacial em cinco pedaços, sendo que dois caíram aqui em Argina. Essa peça, como vocês podem notar, era a cauda do aparelho e não havia ninguém nela quando esta foi encontrada. Já na parte da frente, que caiu próxima a praça principal... – o guia vê as crianças próximas à roda de turistas e aponta para Denis – Venha aqui, menino. Sei que você estava presente no dia em que os extraterrestres invadiram Argina.

- Quê?

O guia abriu espaço entre a multidão e puxou Denis pelo braço.

- Esse garoto teve contato direto com os extraterrestres. Conte-nos mais sobre eles, por favor.

As pessoas olhavam para Denis com tanta curiosidade que o menino entrou no jogo, inventando histórias sobre seu contato com os ETs. Logo o sucesso da nova atração foi noticiado pela mídia e a atividade turística de Argina cresceu muito através dos anos.

Até chegar a época de irem estudar em universidades, Betinho, Eduarda, Marilinha, Lipe e Denis contribuíram muito para incrementar as histórias da visita dos extraterrestres a Argina. Inclusive, acompanhavam os guias em alguns passeios para passar mais credibilidade aos turistas. E depois que a turma saiu da cidade para estudar na capital, os guias trataram de transforma-los nos heróis que salvaram a Terra do ataque dos ETs.

Friday, February 03, 2006

Fome

Cadu, Drica, Nanda, Tony, Rique e Tina nasceram, foram criados e ainda moram em São Paulo. Jovens, na faixa dos 20 a 30 anos, eles são da geração que aprendeu a contar com serviços disponíveis vinte e quatro horas por dia, a semana toda. Adoram sair para jantar depois das onze horas da noite nos fins de semana ou comprar lanches e sobremesas de madrugada, depois das baladas, mesmo quando elas são de quarta-feira, por exemplo.

Desde que todos completaram a maioridade, os seis amigos organizaram várias viagens, em geral para o interior do estado. Isso porque os sítios com piscina, localizados nas cidades menores e mais próximas da capital, eram as hospedagens favoritas da turma. Neles, era possível fazer festas à vontade sem incomodar os vizinhos ou mesmo cozinhar para as refeições, o que os ajudava a gastar menos com baladas e restaurantes.

Mas, para esse verão, eles programaram algo diferente. E agora estão, pela primeira vez, em Florianópolis, a capital de Santa Catarina. Foram seis meses economizando dinheiro para investir nessa viagem e logo que pisaram em uma das belas praias da ilha sentiram que valeu a pena.

O primeiro dia foi de muito sol e mar. Com o carro que alugaram para passear, puderam conhecer três praias. Aproveitaram cada momento até o sol se pôr completamente e a noite escurecer o caminho de volta para a pousada, na qual estão hospedados.

- Meu, esse lugar é show! Mas to cansadaço, vou tirar um cochilo – disse Rique ao entrar no apartamento.

- Eu sou a primeira no banho! – adiantou-se Tina, correndo em direção ao banheiro.

Entre cochilos, banhos e conversas a turma se arrumou e só ficou pronta para sair depois das dez horas da noite. Tony, durante o dia, havia reparado nas faixas dos restaurantes da Lagoa da Conceição sobre os preços das seqüências de camarão e estava louco para pedir uma.

Nas ruas da Lagoa, Cadu é o motorista do carro e, antes de estacionar o veículo, repara que o primeiro restaurante está fechado.

- Opa, seguindo direto pro próximo!

Ao chegar no segundo restaurante, Drica desce do carro para ler o aviso colado na porta.

- Galera, o horário de funcionamento é das onze da manhã até as dez da noite.

- Cê tá brincando, Drica? Que manés! Em pleno verão fechar o restaurante as dez da noite?! – responde Tony, indignado.

- É, parece que não vamos conseguir nada mesmo por aqui agora... Sua seqüência de camarão vai ficar pra amanhã, Tony. – diz Nanda.

- O negócio é ir pro centro, cara. Só no centro as coisas devem funcionar na madrugada dessa ilha. – recomenda Rique para o motorista.

Cadu pega o caminho para o centro e logo se depara com o trânsito. Drica, que está no banco ao lado do motorista, liga o som. Os quatro jovens, apertados no banco traseiro, cantam animados, acompanhando a música do Skank. Passa-se uma hora e eles não estão nem na metade do caminho.

- Cara, tô desacreditando nesse trânsito! – exclama Tony, mais uma vez indignado.

- Eu acho que é por causa daquela balada que vimos de dia, fica logo ali na frente – arrisca Nanda.

- Ai, Cadu, será que não é melhor a gente voltar pra trás? Será que não tem outro caminho? – sugere Tina.

- Acho que a Nanda tem razão, deve ser por causa da balada. – responde Cadu – Já está andando, olha.

O relógio marca uma hora da manhã quando Cadu consegue estacionar o carro no centro de Floripa, em uma vaga bem apertada. A pizzaria do outro lado da rua parece estar aberta. A turma se aproxima e uma mulher, do lado de dentro do estabelecimento, fecha a porta na frente deles.

- Minha linda, nós vamos entrar. – diz Rique para a moça.

- Sinto muito, senhor, mas nós estamos fechando. – responde a garçonete.

No meio da porta, do lado de fora, está colado um papel com o horário da pizzaria: jantar das 18h30 às 01h00.

- Não é possível! Simplesmente não é possível! – reclama Tony, irritado.

- E agora? To morrendo de fome! Não tem nem uma bolachinha na pousada... – chora Tina.

- Meu, esse lugar não existe! Vida noturna só em Sampa mesmo! – diverte-se Rique.

- Pelo menos o Mc Donald’s deve estar aberto, galera. Tem que estar! – lembra Cadu.

Os seis entram no carro e Cadu pega uma rua que acredita ser o caminho para o Mc Donald’s. Ninguém havia lembrado de providenciar um mapa.

- Nós estamos desde as quatro da tarde sem comer... Vou desmaiar desse jeito! – chora Tina mais uma vez.

- Calma, Tininha! Pensa que fome é algo psicológico! – brinca Rique.

- Ai, não é por aqui... Que droga! – pensa Cadu em voz alta.

- Se você tivesse tentado primeiro o caminho que te falei, já estávamos lá! Essa ilha nem é tão complicada pra você se perder desse jeito! – emburra Drica.

- Ô mané, por aqui, daqui a pouco, estamos de volta pro sul da ilha! – diz Nanda, cutucando Cadu nas costas.

- Já sei, já sei! Vocês querem parar de falar?! – irrita-se Cadu.

Quase duas horas da madrugada, Cadu, Drica, Nanda, Rique, Tony e Tina conseguem entrar no Mc Donald’s. Felizmente, a lanchonete resolvera funcionar até as seis horas da manhã durante o verão. Depois de dois lanches completos para cada um, não havia mais nada a fazer a não ser voltar para a pousada e descansar para o dia seguinte.

- Amanhã eu como minha seqüência de camarão! De qualquer jeito! – promete Tony.

- Vamos é fazer compras, isso sim. Deixar bolachas na pousada de reserva – determina Tina.

- Eu tô tranqüila agora. Gente, o Mc fica aberto! Já podemos vir ao Mc todos os dias! – Drica ri e os outros riem com ela.

- Você adorou que a solução foi o Mc, né, ô viciada em lanches? – Cadu dá um beijo na testa da namorada.

- Nunca mais eu passo fome desse jeito, cara! Vou morar em Sampa pra sempre! – finaliza Rique.