Friday, September 29, 2006

Trambique contra o trambiqueiro

Guia turístico de uma grande agência do Rio de Janeiro, Roberto levava grupos de estrangeiros para passear no bairro de Santa Teresa aos sábados. Seu roteiro ecológico incluía uma trilha na mata, na qual talvez os gringos pensassem que conheceriam índios. Porém só encontravam os criminosos.

Roberto crescera no Morro Dona Marta junto a Falcão e Fumaça. Ao contrário dos dois amigos de infância, resolvera não dedicar tempo integral a vida do crime. Estudando com muita dedicação, conseguira uma bolsa de estudos em um curso de inglês. O dono da agência de turismo gostou tanto da sua fluência no idioma estrangeiro que o contratou logo na primeira entrevista.

Mas o salário fixo e o aprendizado obtido pelo contato com os turistas não eram suficientes. Roberto queria se vestir como um americano rico, ter as máquinas digitais com as quais os japoneses tiravam fotos, ser tão sofisticado quanto os europeus. O meio mais fácil para obter tudo isso era roubar o que seus clientes tinham.

Falcão liderava o grupo que vinha ganhando notoriedade entre os demais assaltantes do morro. Fumaça o seguia como se fosse um vice-líder. Mais três jovens os acompanhavam até a trilha na mata onde Roberto levava os turistas.

Os assaltos contra os grupos que Roberto guiava ocorriam a cada dois ou três meses, para não alardear a imprensa e, principalmente, a agência de turismo. Roberto também indicava o roteiro de outros guias por toda a cidade carioca, para manter o trabalho de Falcão e Fumaça ativo.

Os executores da ação criminosa ficavam com o dinheiro e Roberto ficava com os objetos. Durante os dias de folga, o guia turístico levava suas namoradas para passear no Corcovado e no Pão de Açúcar, sempre muito bem vestido, usando óculos caríssimos e registrando cada momento com câmeras digitais das mais atuais.

E tudo ia muito bem, até o dia em que o grupo de Falcão cresceu e ele deixou de fazer o assalto aos estrangeiros de Roberto pessoalmente. Fumaça estava tão cheio de fumaça na cabeça nesse dia, que esqueceu de avisar aos executores da ação que o guia era gente deles.

O jovem de apelido Nervoso liderava os demais. Ele havia se mudado há pouco tempo para a favela Santa Marta e não conhecia Roberto. Um estrangeiro reagiu quando um garoto encapuzado tentou lhe arrancar a corrente de ouro do pescoço e Nervoso logo deu um tiro no pé do atrevido.

- Seguinte, gringada: comigo não tem moleza, falô?

Roberto espantou-se ao ver a cena. Mas não podia despertar suspeita.

- Stay calm, stay calm… - foi tudo que pôde dizer aos demais turistas.

- Aê, guiazinho de merda! O próximo gringo que se metê a engraçadinho, o bicho vai pegá! Falô?

O falatório crescia em volta do turista com o pé ferido e isso deixava Nervoso vermelho de raiva. Roberto desesperou-se. Ao tentar explicar a situação aos estrangeiros, não conseguiu falar uma palavra em inglês. Engasgado, lançou um olhar de súplica em direção a Nervoso e encontrou o cano da arma a dois centímetros de sua cabeça.

- Tú tá de brincadeira comigo, rapá? – gritou Nervoso, de forma ameaçadora.

Lágrimas escorriam dos olhos de Roberto.

“Valeu a pena?” – pensou.

Ele não teve tempo de responder a pergunta. Uma bala o deixou inconsciente. Os assaltantes ainda levaram seus óculos americanos, sua carteira inglesa e seus sapatos italianos.