Friday, January 27, 2006

Violência urbana

Durante a semana, Pedro vai ao apartamento da namorada, na zona sul de São Paulo, às terças e quintas. Na sexta-feira, é ela quem vai para a casa do namorado, na zona norte, ficando lá todo o final de semana.
Não é difícil para Pedro conseguir uma vaga na frente do prédio da namorada. Mas, nesta quinta-feira, havia movimento no salão de festas do condomínio e ele teve que deixar o carro estacionado do outro lado da rua, um quarteirão antes da guarita do porteiro.
Já passava das onze horas da noite. Pedro sentia-se cansado e queria chegar logo em casa. Estava abrindo a porta do carro do lado do motorista, quando dois homens, um mais baixo e outro mais alto do que ele, vieram em sua direção.
- Passa a carteira, ô playboy – intimou o mais alto, apontando uma faca grande e bem afiada para a barriga de Pedro, que levantou os braços.
- Calma. Eu vou abaixar esse braço agora, para pegar a carteira no bolso de trás da calça – Pedro respondeu lentamente, acenando com um dos braços erguidos.
Enquanto o assaltante mais alto conferia os valores em dinheiro dentro da carteira, e o mais baixo apontava outra faca em sua direção, Pedro arriscou negociar a liberação dos seus documentos:
- Por favor, pode levar tudo que o senhor quiser. Só deixe meus documentos. Sabe como é, é um trabalhão tirar documentos novos e...
- Cala a boca, mané – interrompeu o assaltante alto, jogando a carteira para Pedro – Só tô interessado na grana, tá sabendo? Foda-se teus documentos!
O homem mais baixo observou o interior do carro de Pedro.
- Mano, olha esse som! Vamo levá, vamo levá!
O assaltante alto aproximava-se do carro quando uma Pick-up apareceu em alta velocidade no início da rua, a três quarteirões dali, fazendo os pneus cantarem no asfalto. Seu motorista parou o veículo de repente ao lado de Pedro e dos assaltantes e desceu com uma arma calibre 38 em punho. Os dois homens guardaram suas facas nas calças e saíram correndo, perseguidos pelos tiros disparados pelo senhor alto e forte, vestido com um terno preto, que descera da Pick-up.
Enquanto era assaltado pelos homens com facas, Pedro não sentiu medo. Mas, naquele momento, sentia o corpo tremer diante do cara armado, e chegou a pensar que seria seqüestrado. E se estivesse em meio a uma guerra entre gangues? Os ladrões com facas teriam invadido o território do fortão? Para tentar manter a calma, lembrou dos programas que assiste de vez em quando, nas tardes de domingo, e esboçou um pequeno sorriso amarelo ao pensar que aquilo poderia ser uma pegadinha televisiva. Onde estariam as câmeras? Tudo é possível atualmente.
O senhor alto e forte caminhou na direção de Pedro. O rapaz não sabia o que fazer.
- Você está bem?
O corpo de Pedro parou de tremer. Sua expressão de dúvida sobre aquela pergunta alertou o homem forte, que guardou o revólver na parte interna do paletó. Quando estendeu sua mão para o rapaz novamente, nela havia um cartão de visitas.
- Meu nome é Ronaldo Cobra, sou membro do Batalhão de Choque da Polícia Militar. – a voz dele era intimidadora – Mas faço bicos como segurança nas horas vagas. – continuou em um tom mais informal.
- Eh... Ah... Desculpa... Senhor... Cobra? Mas como o senhor sabia da presença desses sujeitos aqui?
- Esses dois vêm assaltando muita gente nessa região há um mês. Estou trabalhando como segurança em uma danceteria aqui perto e ouvi algumas pessoas fazendo a descrição da dupla. Achei que hoje eles não me escapariam.
- Ah, sim... Então, o senhor os viu passando, pegou um carro e veio correndo?
- Hum, mais ou menos... – Cobra abriu um sorriso, sem motivo aparente, e cruzou os braços, olhando para Pedro.
- Bom, então, obrigado pela ajuda! Boa noite aí! – disse Pedro rapidamente.
Ele mal apertou a mão de Ronaldo e entrou no carro. Em poucos minutos, estava em uma avenida, a caminho de casa. Ao parar no semáforo, olhou o cartão de Ronaldo Cobra.
- Que história mais estranha! Parece até que tô dormindo! E ainda por cima aquele sorriso esquisito... Será que o louco da Pick-up tava de olho em mim? Sai pra lá!
A luz verde acendeu e Pedro seguiu em frente, ligando para a namorada, pelo celular.
- Amor, acho melhor eu ficar um tempo sem aparecer na sua rua...
Numa esquina próxima dali, um homem forte, de terno preto, dentro de uma Pick-up, observava o carro de Pedro se afastar. No banco de trás da Pick-up, havia mais dois homens.